STF decide pela impossibilidade da inclusão direta de empresa na fase de execução trabalhista sem participação na fase de conhecimento
Daniel Ribeiro e Henrique Figueiredo Costa Abrantes
O Supremo Tribunal Federal (“STF”), ao julgar o Recurso Extraordinário nº 1.387.795 (1), que serviu como paradigma para o Tema nº 1.232 da Repercussão Geral, estabeleceu entendimento vinculante a respeito da inclusão de empresas integrantes de grupo econômico no polo passivo da fase de execução de processo trabalhista no qual elas não figuraram como rés na fase de conhecimento (2).
A Corte Suprema determinou que tal inclusão, que era frequentemente realizada de forma direta pela Justiça do Trabalho com base na responsabilidade solidária prevista no artigo 2º, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho (“CLT”), somente é admissível mediante a observância de requisitos processuais e materiais rigorosos. O novo regime exige a instauração prévia do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (“IDPJ”), conforme os artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil (“CPC”) e a comprovação de abuso de personalidade jurídica.
Tal decisão visa resguardar de forma concreta as garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, previstas no artigo 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal, para os terceiros chamados a responderem pela dívida.
A jurisprudência da Justiça do Trabalho, orientada pela natureza alimentar do crédito trabalhista e pelo princípio da proteção do hipossuficiente, comumente permitia o redirecionamento da execução contra qualquer empresa identificada como parte de mesmo grupo econômico da devedora principal, mesmo que essa empresa não tivesse sido incluída na fase de conhecimento.
A sistemática adotada pelo Tribunal Superior do Trabalho (“TST”) fundamentava-se na premissa de que a responsabilidade solidária decorrente do grupo econômico, nos termos do artigo 2º, § 2º, da CLT, prescindia da desconsideração da personalidade jurídica, sendo responsabilidade legalmente imposta, e não meramente derivada da fraude. Contudo, a inclusão direta na fase executiva resultava na afetação patrimonial de empresas sem que lhes fossem oportunizadas a discussão adequada e substancial dos fundamentos jurídicos e fáticos que levaram à condenação e à formação do título judicial, restringindo sua defesa às matérias limitadas nos embargos à execução, como, por exemplo, o pagamento ou a prescrição. Isso gerava questionamento relevante sobre a observância das garantias constitucionais.
No julgamento, através do voto condutor do relator, Ministro Dias Toffoli, foi enfatizada a necessidade de que os princípios constitucionais do processo democrático, como o devido processo legal e o contraditório, sejam observados de maneira irrestrita, inclusive no âmbito do processo do trabalho. O relator esclareceu que o contraditório não se satisfaz com a mera ciência dos atos processuais, mas exige maior amplitude, conferindo às partes a oportunidade de apresentar a sua defesa e influenciar a decisão do órgão jurisdicional. A inclusão de terceiro no polo passivo diretamente na fase de execução, após a consolidação do título executivo e com limitação argumentativa, inviabiliza o exercício pleno desse direito fundamental, uma vez que o terceiro é privado da possibilidade de discutir o mérito da causa, a natureza da relação de emprego e a formação do convencimento do juiz sobre os fatos que geraram a condenação.
Portanto, a inobservância de procedimento que assegure a prévia manifestação e a produção de provas pelo terceiro configura violação da própria Constituição Federal.
A tese fixada para o Tema nº 1.232 da Repercussão Geral é a seguinte:
É permitida a inclusão no polo passivo de execução trabalhista de pessoa jurídica pertencente ao mesmo grupo econômico da parte executada (art. 2º, §§ 2º e 3º da CLT) que não tenha participado da fase de conhecimento, desde que devidamente justificada a pretensão em prévio incidente de desconsideração de personalidade jurídica, nos termos do art. 133 a 137 do CPC, com as modificações do art. 855-A da CLT, devendo ser atendido o requisito do art. 50 do Código Civil (abuso da personalidade jurídica). Aplica-se tal procedimento mesmo aos redirecionamentos operados antes da Reforma Trabalhista de 2017.
Em conclusão, o entendimento do STF impõe maior cautela e rigor processual aos exequentes que buscam redirecionar a execução e respectiva satisfação do crédito trabalhista. A decisão garante maior previsibilidade e segurança jurídica no ambiente empresarial, ao mitigar a possibilidade de inclusões abruptas e arbitrárias na fase executiva. A fixação da tese contribui para a necessária harmonização entre a proteção do crédito trabalhista e os princípios constitucionais do processo democrático.
Mais informações sobre o tema podem ser obtidas com a equipe trabalhista do VLF Advogados.
Daniel Ribeiro
Sócio-executivo da Equipe Trabalhista do VLF Advogados
Henrique Figueiredo Costa Abrantes
Advogado da Equipe Trabalhista do VLF Advogados
(1) STF. RE 1387795. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=6422105. Acesso em: 28 out. 2025.
(2) STF. STF rejeita inclusão de empresas do mesmo grupo econômico na execução de condenação trabalhista. Disponível em: https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-rejeita-inclusao-de-empresas-do-mesmo-grupo-economico-na-execucao-de-condenacao-trabalhista/. Acesso em: 28 out. 2025.