TCU valida análise de exequibilidade da proposta a partir de critérios não expressos no edital
Matheus Emiliano e Maria Tereza Fonseca Dias
No julgamento do processo TC 005.799/2025-2 (1), o Plenário do Tribunal de Contas da União (“TCU”) analisou alegações de irregularidades no Pregão Eletrônico 5/ANA/2025, destinado à contratação de serviços de tecnologia da informação e comunicação. A empresa representante argumentou que a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (“ANA”) teria agido irregularmente ao utilizar critério não previsto no edital para aferir a exequibilidade da proposta vencedora. O critério em questão consistia em indicador técnico que acionava verificação aprofundada caso a soma das variações negativas entre os salários e o “fator k” (2) da proposta superasse 30% em relação aos parâmetros de mercado.
Em sua defesa, a ANA esclareceu que o referido percentual não foi utilizado como critério de julgamento ou desclassificação automática, mas como mecanismo interno de triagem para identificar propostas que demandavam diligências adicionais. A Agência sustentou que a medida, amparada no edital e no artigo 59 da Lei nº 14.133/2021, visava apenas confirmar a capacidade da licitante de executar o contrato com os preços ofertados, protegendo o interesse público contra possíveis propostas inexequíveis.
Ao analisar o mérito, o relator, Ministro Jorge Oliveira, acompanhado pelo colegiado, concluiu que a conduta da ANA foi legítima e proporcional. O voto destacou que a verificação da exequibilidade é dever da Administração, sendo lícito o uso de ferramentas técnicas auxiliares para aprofundar a análise de propostas com preços significativamente reduzidos. O TCU entendeu que a utilização do parâmetro de 30% – ainda que não expressamente constante no edital – não feriu os princípios da vinculação ao instrumento convocatório ou da isonomia, pois foi aplicado como filtro para a realização de diligências, garantindo à licitante a oportunidade de demonstrar a viabilidade de sua oferta.
O acórdão também rejeitou outras alegações, como a suposta omissão de custos obrigatórios na planilha da empresa vencedora e o não atendimento de perfis técnicos. No primeiro caso, o TCU considerou que, por se tratar de contrato sem dedicação exclusiva de mão de obra, não era exigível o detalhamento exaustivo de todos os encargos na proposta, remanescendo a obrigação da contratada de cumprir a convenção coletiva durante a execução do contrato. Quanto aos perfis técnicos, a Corte validou a análise da ANA, que priorizou a compatibilidade substancial das atribuições e da experiência dos profissionais em detrimento da correspondência literal entre nomenclaturas de cargos.
A decisão do TCU representa importante precedente sobre o equilíbrio entre o formalismo nos procedimentos licitatórios e a busca pela eficiência administrativa. Ao validar a utilização de critérios técnicos de análise não detalhados no edital, desde que aplicados de forma isonômica e como instrumento de apoio à diligência, a Corte privilegia o fim precípuo das licitações: a obtenção da proposta efetivamente mais vantajosa para a Administração Pública. O julgado confere maior segurança jurídica aos gestores para atuarem de forma proativa na verificação da sustentabilidade das propostas, mitigando riscos de futuras inadimplências contratuais e reforçando que a vinculação ao edital não pode ser interpretada como impeditivo à análise aprofundada e criteriosa da exequibilidade.
Matheus Emiliano
Advogado da Equipe de Direito Administrativo e Regulatório do VLF Advogados
Maria Tereza Fonseca Dias
Sócia-executiva da Equipe de Direito Administrativo e Regulatório do VLF Advogados
(1) A íntegra do Acórdão 1979/2025 – Plenário está disponível em: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/redireciona/acordao-completo/ACORDAO-COMPLETO-2723857. Acesso em: 26 set. 2025.
(2) Conforme definição trazida pela Portaria SGD/MGI nº 6.680/2024, o fator-K é um parâmetro usual de mercado para se estimar o custo de um serviço com base na remuneração do profissional. Em outros termos, o fator-K indica quantos reais são pagos à empresa contratada para cada real pago pela empresa ao trabalhador.